Na semana passada, peguei um táxi na cidade do Rio de Janeiro e a rua em que eu estava foi bloqueada por um carro. No minuto seguinte, outro motorista saiu do carro e, gritando, endureceu o dedo na cara do dono da rua. Ele cuspiu tantas maldições nele que me fez perguntar, sem querer, em voz alta: Qual é o nível de tolerância desse homem para agir como um idiota?
Eu vi naquela imagem bizarra, o retrato dos nossos dias: em praça pública queimamos novas ‘bruxas’. E assim, compartilhamos um vídeo da intimidade de alguém, humilhamos crianças presas a um poste, zombamos de um doador de leite materno, torcemos nosso rosto nas roupas justas do obeso ou ficamos enojados com a escolha sexual de alguém. Invertemos a diversão e perdemos o conceito de solidariedade quando medimos o mundo com nosso governante.
Nós nos comportamos como verdadeiros inquisidores do mundo. E com isso julgamos, ameaçamos e ofendemos pessoas que nem pediram a nossa opinião, nem proximidade. E do outro lado da história, há alguém que terá dificuldade em sair do ataque ileso.
A ideia de conviver com as diferenças (não mais) está em nós. E a intolerância que experimentamos reverbera e se enraíza sem nem perceber. E então, antes mesmo de tentar, já desistimos. É a menina que, lembrando-se de seu ex-namorado ciumento e agressivo, acaba com o atual por prever o que ela não pode. Quando sentimos nossa vulnerabilidade, talvez seja o momento certo para nos dar uma segunda chance. De ser a antítese da caça às bruxas.
Não falar mal da vida de outras pessoas deve ser tão natural quanto não jogar lixo na rua. Porque no final, o resultado é o mesmo. Todos estamos sujeitos a pisar na merda espalhada pelo lambão. E pior, podemos nos acostumar a afundar nossas narinas na lama.
Vamos deixar a intolerância para aqueles que passam incólumes pela vida. E isso é tão verdadeiro quanto uma alucinação esquizofrênica.